sexta-feira, 21 de maio de 2021

 

Porque Planalto do Itatiaia?

Helton Perillo Ferreira Leite

Meu primeiro contato com o Parque Nacional do Itatiaia foi aos 5 ou 6 anos em uma viagem familiar ao Planalto. Meu pai e meu tio foram até a base das Prateleiras, minha mãe, minha tia, um primo e eu ficamos no jeep, a estrada estava interrompida.

Lembro-me de esperarmos na estrada, à direita estavam as montanhas e à esquerda um enorme abismo. Na realidade apenas um exagero da memória infantil, era só o vale do rio Preto que se estende paralelo à estrada entre o abrigo Rebouças e o início da caminhada para as Prateleiras, local onde está a cachoeira das Flores. Lembro de pouca coisa, nem se estava frio, parece-me que tinha chuva ou barro, não sei.

Voltei várias vezes ao Planalto durante toda a minha vida, mas visitei a parte baixa, a região da sede e dos hotéis somente após adulto e já com filhos.

Meu foco no Parque do Itatiaia foi e é o Planalto, a parte alta, os picos das Agulhas Negras e das Prateleiras. E, claro, o imenso abismo.

Há quase 10 anos resolvi conhecer um pouco mais sobre o parque, visitei a sede administrativa, a biblioteca e o museu, tudo na parte baixa. Encontrei muita coisa escrita sobre o parque, mas sempre dispersa, difícil de achar, difícil de ler.

Comecei a anotar e a resumir alguns dados que achei interessante, o tipo de rocha, o fato de já ter nevado por lá, o nome de algumas plantas, etc. Descobri alguns mapas antigos, achei umas fotos de pedras que nunca tinha visto. Iniciei uma pesquisa sistemática sobre o Parque do Itatiaia, para meu simples prazer, para satisfazer minhas curiosidades.

Fotografar sempre gostei, então comecei a captar imagens parecidas com as que eu já gostava e a registrar outras que nunca tinha visto.

Comecei a juntar tudo e a sonhar com um livro. Somente em 2006 resolvi que em homenagem aos 70 anos eu queria dar ao Parque um livro que facilitasse, que simplificasse a outros curiosos conhecer melhor as singularidades do Planalto.

Em 14.06.2007 o primeiro parque nacional brasileiro completou 70 anos, um respeitável senhor.

Porque só o Planalto? Itatiaia é tão maior, tão mais amplo, tão mais complexo.

Para mim Itatiaia, desde menino, sempre foi só o Planalto. É a área mais diferente do resto do Brasil, lá estão os maiores picos, as plantas mais raras, o clima mais frio, a estrada mais alta.

Da minha casa em Lorena até o abrigo Rebouças, a 2.350 m de altitude, são só 99 km, pouco menos de duas horas. Um pulo. Em pouco tempo saio do mundo real, concreto e estou no mundo de sonho, no mundo fantástico da minha imaginação infantil.

Lá volto a ser criança, sem responsabilidades, sem cansaços, cheio de alegrias e novidades.

O Planalto é a parte menos conhecida e visitada do parque, só 13 % dos visitantes se dirigem ao Planalto, os outros preferem a parte baixa, a área da mata atlântica linda e verde com suas cachoeiras e hotéis.

No Planalto quase não há infra-estrutura, a paisagem é agreste, selvagem, natural.

As matas da região sudeste brasileira são, em sua quase totalidade, áreas já alteradas pela ação humana, seja por indígenas antes do Cabral ou por “modernos” madeireiros que visavam abastecer as marias-fumaça ou plantar café.

Quase todas as pessoas com quem falo sobre Itatiaia nunca o visitaram, as que conhecem foram apenas até a parte baixa, o Planalto é um notável desconhecido do brasileiro comum.

O Planalto do Itatiaia, seus campos e suas pedras formam a paisagem mais próxima do natural que conheço. É a região menos antropizada ao meu alcance. Particularmente suas "ilhas de vegetação" entre as pedras, os enclaves de plantas, desinteressantes do ponto de vista econômico e naturalmente protegidas do fogo pela rocha, são as comunidades vegetais menos alteradas de todo o centro-sul nacional.

Com enormes vantagens de conforto e acesso, o Planalto do Itatiaia está a poucos quilômetros do Rio e de São Paulo, as maiores cidades do país, uma estrada alcança os 2.400 m de altitude, lá não há carrapatos, mosquitos nem calor. Na primavera e no verão suas plantas explodem em flores de cores e formas diversas de especial beleza. Suas rochas são raras no Brasil e pouco freqüentes em qualquer local do mundo. São rochas novas em folha, tem cerca de 65 milhões de anos, contemporâneas dos dinossauros.

Quem não conhece a natureza não pode se preocupar com sua preservação. É preciso conhecer para amar. É preciso amar para salvar. É preciso salvar para quem vamos amar.

Sabendo de tudo isto, seria egoísmo meu não divulgar Itatiaia, seria mesquinho não convidar outras pessoas a conhecerem.

Não há no país local ao mesmo tempo mais belo, mais exclusivo, mais especial, melhor preservado e com acesso tão fácil.

O Planalto é único.

Por isto o livro Planalto do Itatiaia – Região das Agulhas Negras.